Os elementos e assessórios nas danças ciganas.
Em primeiro lugar, é importante lembrar que o vocábulo cigano é um aportuguesamento da palavra “athiganói”, que em grego significa intocáveis. Sim, dessa palavra grega, carregada de preconceito e discriminação, nasceram: “gitano” (Espanha), “gitan” (França), “zíngaro” Itália, cigano (Portugal) etc. Portanto, em si mesma essa palavra é uma, errônea, generalização para designar diversos grupos de etnia Romani. Deduz-se facilmente disto que existem danças ciganas, e não uma única modalidade de dança para todos os grupos.
Abaixo eis um panorama, infelizmente, real das danças ciganas no mundo:
População cigana na Europa
País |
População cigana |
Estado da dança |
Alemanha |
120.000 |
Não há pratica de dança |
Áustria |
20.000 |
Dançam a tradição |
Bélgica |
15.000 |
Não há pratica de dança |
Dinamarca |
4.500 |
Não há pratica de dança |
Finlândia |
5.000 |
Não há pratica de dança |
Suécia |
20.000 |
Não há pratica de dança |
Reino Unido |
80.000 |
Não há pratica de dança |
Holanda |
30.000 |
Não há pratica de dança |
Itália |
120.000 |
Não há pratica de dança |
Irlanda |
20.000 |
Não há pratica de dança |
Grécia |
200.000 |
Dançam a tradição |
França |
300.000 |
Não há pratica de dança |
Espanha |
600.000 |
Palos do flamenco/rumba |
Portugal |
100.000 |
Dançam rumba |
População cigana no Leste da Europa
País |
População cigana |
Estado da dança |
Romênia |
2.500.000 |
Dançam a tradição |
Bulgária |
920.000 |
Dançam a tradição |
Hungria |
600.000 |
Dançam a tradição |
Rússia |
500.000 |
Dançam o folclore russo |
Eslováquia |
590.000 |
Não há pratica de dança |
Iugoslávia |
420.000 |
Não há pratica de dança |
Macedônia |
320.000 |
Dançam a tradição |
Republica Checa |
300.000 |
Não há pratica de dança |
Albânia |
130.000 |
Dançam a tradição |
Bósnia |
55.000 |
Dançam a tradição |
Croácia |
45.000 |
Dançam a tradição |
População cigana no Brasil
Grupo cigano |
População |
Estado da dança |
Calon |
400.000 |
Dançam sertanejo/forró |
Rom |
400.000 |
Dançam a tradição |
Sinti |
300 |
Dançam a tradição |
Sobre os elementos e assessórios:
Dança do punhal
A concepção do uso de elementos e seus simbolismos e significados está diretamente ligada à crença pessoal e até mesmo à invenção de pessoas que não são originárias de uma das diversas etnias ciganas. Essas invenções sobre simbolismos de elementos na dança chegam a tal ponto, que mesmo alguns fatos históricos foram deturpados. Exemplo, a dança feita com punhais foi um enfrentamento que chegou a ocorrer em praças publicas, na Espanha, durante o século 16. Mas era realizado por prostitutas! Nunca uma cigana se prestaria a tal papel.
Hoje, vemos não ciganas realizando a tal "dança do punhal" e tentando justificar o injustificável: “afirmando que o punhal está ligado ao elemento ar e a terra e que simboliza a limpeza do ambiente e do corpo”. É obvio que isto está vinculado ao âmbito da crença, e que não tem nada a ver com cultura e etnia cigana. E finalizando, dentro da cultura cigana o punhal é um elemento simbólico exclusivamente masculino, e está ligado à virilidade quando é empregado no ritual de batismo do menino (em alguns grupos ciganos).
Dança do pandeiro
Dentro da cultura cigana, ou melhor, por explicação cultural temos o seguinte: no leste da Europa é sabido que o inverno é muito rigoroso, e o que predomina é uma visão desoladora de branco-gelo para todos os lados em que se olhe. Então, foi por esse motivo que ciganas, camponesas, da Hungria e Rússia passaram a receber a chegada da primavera, com saias multicoloridas e dançavam com alegria, ao som do pandeiro (que também era enfeitado com fitas coloridas). Aliás, pandeiro e colher de pau eram os instrumentos predominantes na região campestre. Mas vejam não há nenhum significado místico nisso. O multicolorido nas saias e nas fitas do pandeiro era apenas uma forma de negar a falta de vida que a neve causava no visual.
Dança com leque/abanico
Essa dança era originalmente praticada pelas ciganas da Espanha. Trazido para a Europa no século XV, através de comerciantes portugueses, o leque ou abanico criou raízes em Andaluzia. Naquela época era comum ver ciganos e ciganas, dançando com seus abanicos/leques os palos de flamenco. O tempo passou e o abanico/leque virou apenas um complemento do traje feminino. E as ciganas desenvolveram uma linguagem mímica com o abanico:
- ao abanar suavemente na altura dos seios, dizia: procuro um namorado;
- ao abanar rapidamente na altura dos seios: sou comprometida;
- fechando o abanico/leque sobre a bochecha: eu gosto de você;
- fechar abruptamente o abanico/leque: eu te odeio.
Sendo assim, nada relacionado com a visão mística que atribuem a este assessório.
Dança com xale/mantón
A utilização do “mantón” foi introduzida pelas ciganas Sevilla quando dançavam o ritmo de soleá por buleria. E esta introdução do “mantón” não atendia a nenhum apelo místico, mas sim, representava a possibilidade de dar mais graça aos movimentos de braço nesse palo do flamenco.
Um pouco da história do “mantón”: Reza a lenda que na época das colônias, cargas de tabaco chegavam à Sevilla, vindas das Filipinas. Este tabaco era embrulhado em grandes pedaços de seda, que não eram comercializadas por apresentarem falhas. Eram pedaços de seda cortados em quadrados, e a seda absorvia a umidade do tabaco, protegendo a mercadoria. As ciganas de Sevilla adicionaram franjas aos pedaços de seda. Que foram posteriormente chamados de “mantones de Manila” (Manila é a capital das Filipinas). E estes foram enriquecidos pelas não ciganas ricas, com bordados formosos. Por sua vez, o xale utilizado pela cigana do Leste Europeu também atendia à mesma utilização.
E o mesmo vale para outros elementos e assessórios. Sempre existe uma explicação histórica e cultural, para sua utilização. O lado místico ou exotérico geralmente é inventado por não ciganos.
Ao apresentar estes fatos históricos, não pretendo negar algo que conheço muito bem: é claro que existem ciganos (as) que dançam ritualisticamente. E quando ele ou ela pratica uma dança ritualística, isso é um ato que ocorre, normalmente, em âmbito familiar; dentro do grupo e para o grupo do qual ele (a) faz parte. Portanto, toda a apresentação pública que um (a) cigano (a) venha a apresentar sempre terá a conotação de arte e cultura, mas nunca da exposição de sua crença.
Um pedido...
Atualmente há um número muito grande de academias oferecendo
aulas de "dança cigana", sem a preocupação e o critério de
preservar o que de mais puro existe no bailar de uma cigana.
A dança cigana em sua essência não possui coreografia
e as academias estão se apropriando do nome dança cigana de forma indevida,
levando as suas alunas a serem verdadeiras caricaturas de uma cigana, gerando inúmeros estereótipos.
A dança cigana não é ensinada. O bailar cigano é despertado
dentro de cada mulher, naquilo que ela traz de sua ancestralidade no
culto e manipulação dos elementos e nos círculos familiares. Para que isso ocorra exige-se da
"professora" um mínino de conhecimento da cultura e a espiritualidade
para desenvolver as capacidades de cada iniciada na dança.
Apesar disto, somos gratos pelo carinho com que as
professoras não ciganas procuram, de acordo com o conhecimento
que possuem, preservar a nossa cultura. Só recomendamos que
ao divulgar seus cursos, utilizem o título "Aulas de Dança
no Estilo Cigano" ou "Aulas de Dança Cigana Artística" . |